Cuidadores informais à espera de legislação que reconheça o seu estatuto

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Em Portugal existirão mais de 800 mil pessoas que prestam cuidados informais. Tendo em conta que estes cuidados estão, em grande medida, por reconhecer, o BE apresentou um projecto-lei que cria o Estatuto do Cuidador Informal e reforça as medidas de apoio a pessoas dependentes. Também o CDS-PP apresentou, na semana passada, uma proposta sobre o mesmo assunto, que terão que ser agora discutidas no Parlamento.
Entretanto, o governo avançou com uma proposta de lei com medidas de apoio ao cuidador informal, que irá funcionar através de projetos-piloto em todo o país, a serem avaliados ao fim de um ano.

O cuidador informal é por norma o familiar ou amigo que assume os cuidados de um dependente (criança, idoso, deficiente ou doente), fora do âmbito profissional e sem qualquer contrapartida financeira. Esta é a realidade de muitos portugueses, mas cujos direitos ainda estão muito desprotegidos, pelo que é defendida a criação do Estatuto de Cuidador Informal.
O cuidador informal típico é mulher, familiar da pessoa cuidada e tem entre os 45 e os 75 anos, refere um estudo da Entidade Reguladora da Saúde (ERS) sobre o Acesso, Qualidade e Concorrência nos Cuidados Continuados e Paliativos, datado de 2015. O relatório, citado pelo BE no seu projecto-lei, considera também que Portugal tem a “maior taxa de cuidados domiciliários informais da Europa, a menor taxa de prestação de cuidados não domiciliários e uma das menores taxas de cobertura de cuidados formais, principalmente em função da escassez de trabalhadores formais”.
O relatório revela que em Portugal o valor estimado anual dos serviços prestados pelos cuidados familiares possa rondar os 4 mil milhões de euros em cada ano. “Este trabalho, essencialmente feminino, não é reconhecido formalmente e não é remunerado”, refere. Para além do impacto económico, há também o físico e o psicológico, com um maior risco de pobreza, abandono do emprego, isolamento, ruptura de relações e da vida social, depressões, exaustão, stress, entre outros problemas.
Além da escassez de cuidados formais, há também poucas respostas ao nível da informação, da formação e da capacitação das cuidadoras, do apoio ao nível da saúde e da garantia do direito ao descanso. Esta iniciativa legislativa defende a criação de um estatuto que reconheça direitos em diversas dimensões, tal como já acontece em países como a França, Reino Unido, Alemanha ou Suécia.
Entre as propostas estão o direito do cuidador informal a, pelo menos, quatro dias de descanso mensais e a 11 dias seguidos de férias, sendo reconhecidos e integrados na rede nacional de cuidados integrados. Durante as folgas do cuidador os cuidados domiciliários deverão ser assegurados por equipas de Cuidados Continuados Integrados ou a estadia de curta duração em unidades de internamento.
Já o projecto-lei apresentado pelo CDS-PP a 13 de Fevereiro, prevê o pagamento, ao familiar responsável por cuidar de alguém, de 50% do valor que seria pago a uma instituição. Outra das medidas propostas é a alteração ao código do imposto sobre o rendimento das pessoas de modo a beneficiar os cuidadores.
Os centristas propõem também que o tempo dedicado ao cuidado do dependente seja considerado para a reforma, assim como a criação do “cuidado familiar”, que seria semelhante ao acolhimento familiar, em que o cuidado da pessoa é atribuído a membros da própria família e não a terceiros.

Governo propõe projectos-piloto

Na passada sexta-feira (15 de Fevereiro) o governo apresentou uma proposta de lei com medidas de apoio ao cuidador informal, que também ainda será debatida na Assembleia da República, com os projectos sobre a mesma matéria do Bloco de Esquerda e do CDS/PP. Caso a proposta do governo seja aceite esta irá funcionar através de projectos-piloto em todo o país, a serem avaliados ao fim de um ano e, caso o resultado seja positivo, as medidas serão generalizadas.
Este novo modelo de apoio social irá assentar em redes já existentes, sobretudo as de cuidados integrados e continuados, mas também com a articulação com serviços dos Ministérios da Saúde e do Trabalho, as autarquias e a sociedade civil. O subsídio para os cuidadores informais só poderá avançar depois do projecto-piloto quando a lei for uma realidade, em 2020, explicou o ministro do Trabalho, Vieira da Silva, fazendo notar que não seria possível, do ponto de vista legal, instituir uma prestação social com um valor fixado num quadro de projetos-piloto.
Esta primeira fase irá abranger 15% do território nacional. Através da utilização da base de dados da Segurança Social foram identificadas 230 a 240 mil pessoas cuidadas, com situações diversas de dependência. A proposta de lei prevê dois tipos de cuidadores: um “cuidador informal principal” e um “cuidador principal não principal”. No no primeiro caso, o cuidador não exerce nenhuma actividade profissional, pelo que poderá ter acesso a um subsídio, de acordo com a sua condição de recursos. Contudo, este subsídio não estará disponível durante os projectos-piloto, em que serão atribuídas outras prestações de acordo com as situações dos agregados. Outra das medidas propostas pelo governo é a indicação de um profissional de saúde para ser o contacto de referência, que terá a cargo o processo e servirá como elo de ligação entre as famílias e os serviços.
O governo define como “cuidador informal principal” um familiar até ao quarto grau da pessoa cuidada, que a acompanha e cuida de forma permanente. Para além disso, vive com ela em comunhão de habitação e não aufere qualquer remuneração de actividade profissional ou pelos cuidados que presta à pessoa.
Já o “cuidador informal não principal” será um familiar até ao quarto grau de parentesco, que acompanha e cuida da pessoa de forma regular mas não permanente. Pode auferir ou não remuneração e pode, ou não, viver em comunhão de habitação.